Caro José Mário Branco,
Lembro-me de si todos os dias.
Ainda não apaguei o seu número, há sempre um ímpeto para contar-lhe as novidades.
Continuo em busca da grande razão, a tentar sobreviver num mundo cada vez mais feroz.
Não sei que tempo é este: as pessoas estão na cidade e permanecem desconhecidas.
Os dias são estranhos.
A liberdade é uma memória vaga daquilo que já fomos, daquilo que não seremos.
Continuo a perguntar quantos é que paramos para pensar nisto?
Quantos é que nós somos?
Quantos é que lutamos diariamente para inverter o ritmo, a rotina e apontar aos olhos da injustiça o que a justiça não quer fazer por nós?
Quantos é que não gostaríamos de mudar o que não quer ser mudado?
A cidade e o mundo estão diferentes.
Só nos resta amar verdadeiramente as pessoas.
Inventar o afecto e descartar todas as mentiras que nos são oferecidas.
Só se pode combater se não se perder o rasto da verdade.
É preciso descobrir para que vivemos e como queremos viver.
Conte comigo para cumprir o seu sonho de ver desaparecer o sofrimento humano.
Lisboa, 25 de Maio de 2021
Fotografia de Tiago Fezas Vital
na gravação do álbum RUAS E MEMÓRIAS